Tolerante na área dos costumes, igreja
evangélica atrai ricos e famosos
evangélica atrai ricos e famosos
Maurício Lima, de Brasília
Ana Araújo |
Culto dominical em Bras�lia da Sara Nossa Terra: padr�es de comportamento muito mais liberais e met�foras com imagens cient�ficas |
O que pode reunir figuras tão distintas quanto a ex-modelo Monique Evans, o jogador de futebol Marcelinho Carioca, o deputado federal Paulo Octávio e a cantora Baby do Brasil? Resposta: um culto da Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra. Fundada em 1992, a igreja neopentecostal é o mais novo fenômeno no campo das religiões brasileiras. Além de reunir uma penca de famosos (veja quadro), tem o maior crescimento proporcional entre as igrejas evangélicas do Brasil. Dobra seu rebanho a cada dois anos, desempenho que nem denominações mais conhecidas, como a Universal do Reino de Deus ou a Assembléia de Deus, conseguiram em tão pouco tempo. Hoje, a Sara Nossa Terra possui quase 100.000 fiéis no país, cerca de 300 templos em todos os Estados e já fincou sua cruz em Portugal, Paraguai, Bolívia e até nos Estados Unidos. "Ela vem conseguindo crescer exatamente no filão em que essas igrejas são mais fracas: a classe média", diz Andréa Damacena, socióloga do Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (Ceris), do Rio de Janeiro.
Atualmente, 45% dos fiéis da Sara Nossa Terra são considerados de classe média, número dez vezes maior que nas outras neopentecostais. "Acreditamos que a melhor maneira de transformar o Brasil é evangelizando as classes privilegiadas. Através delas é que se dará a verdadeira mudança", prega o bispo Robson Lemos Rodovalho, o fundador da igreja, que abandonou sua cátedra de física na universidade para entregar-se a Cristo. Daí por que um culto da Sara Nossa Terra é original se comparado ao de outras neopentecostais. Ali, não aparece só gente com roupas recatadas, mulheres de saia comprida e cabelo longo.
Tolerante, a igreja pode ter fiéis como a ex-modelo Monique Evans, que não precisou renunciar à minissaia e ao topless na praia, ou a cantora Gretchen, a rainha do bumbum, que continua aceitando convites para posar nua. Também não exige de homossexuais mudança de comportamento. Nos cultos, sintonizados com as agruras da vida moderna, os pastores falam de cuidados com o corpo e stress. "É uma combinação sedutora. Eles conjugam tudo com a presença do Espírito Santo", diz a pesquisadora Regina Novaes, do Instituto Superior de Estudos da Religião (Iser), também do Rio.
Elétrons e átomos – Nos cultos da Sara Nossa Terra, é comum ver os fiéis chegando em carros importados e vestindo roupas da moda. Aos sábados, os jovens fazem a celebração com música tecno ou rock. Além da liberalidade, seu crescimento se explica pela robustez do cofre. Impulsionada pelo dízimo de fiéis abastados, a igreja acaba de concluir a construção de sua embaixada mundial em Brasília: um templo para 5.000 pessoas, no valor de 4 milhões de reais. Já possui um canal numa TV por assinatura, uma revista, um jornal e estuda a compra de uma rádio e uma emissora de TV. Na Universal ou na Assembléia de Deus, os fiéis costumam contribuir com 10% de seu salário, que, na esmagadora maioria, não passa de dois salários mínimos. Na Sara Nossa Terra, o dízimo vale ouro. O deputado Paulo Octávio, do PFL, um dos empresários mais ricos de Brasília, dá 700 reais mensais para os cofres da igreja. Em matéria de dízimo, um Paulo Octávio vale por 24 membros típicos da Universal.
A expansão da Sara Nossa Terra pode se justificar pelos fiéis famosos, que ajudam a popularizá-la, pela generosidade do dízimo ou pela liberdade de costumes que permite a seus seguidores. Ainda assim, é um fenômeno intrigante no cenário da fé. Até agora, os estudiosos do assunto sempre atribuíram o grosso do crescimento das denominações evangélicas à sua capacidade de receber as camadas mais pobres, marginalizadas. Os templos da Universal, por exemplo, estão sempre abertos a mendigos, prostitutas, drogados e até travestis e costumam crescer na periferia das grandes cidades. Dessa forma, acabam sendo um alento às parcelas da população excluídas e abandonadas pelo Estado. Mas a Sara Nossa Terra faz o caminho inverso e, ainda assim, apresenta um desempenho notável em sua expansão. "Isso sugere que a classe média também tem uma demanda por esse tipo de espiritualidade. O que a Sara Nossa Terra fez foi adaptar seu discurso a esse público", diz Regina Novaes, do Iser.
Faz sentido. A própria origem da Sara Nossa Terra é distinta. Seu embrião nasceu dentro da Universidade Federal de Goiás. Um grupo de estudantes e professores se reunia todas as semanas para ler aBíblia e orar. A turma inicial não tinha mais de vinte adeptos. Depois de alguns anos, o líder dessas reuniões, o professor de física Robson Rodovalho, resolveu fundar uma igreja. Largou a universidade, mudou-se para Brasília e batizou sua criação inspirado numa passagem bíblica em que Jesus Cristo teria dito que retornaria para "sarar a terra". A outra diferença é o corpo de pastores. Boa parte dos 900 pastores e bispos possui diploma de curso superior. São médicos, psicólogos, assistentes sociais. São comuns metáforas inesperadas sobre a fé baseadas em imagens científicas. O próprio Rodovalho gosta de dizer que as pessoas estão para Deus assim como os elétrons estão para os átomos. "Uns estão mais próximos, outros mais longe, mas todos giram a seu redor", prega ele.
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